Nota de Imprensa
Descobertas ondas misteriosas ao longo de disco de formação planetária
Encontradas estruturas únicas em torno de estrela próxima
7 de Outubro de 2015
Com o auxílio de imagens do Very Large Telescope do ESO e do Telescópio Espacial Hubble da NASA/ESA, os astrónomos descobriram estruturas nunca antes observadas no seio de um disco de poeira que rodeia uma estrela próxima. As estruturas do tipo de ondas que se deslocam rapidamente no disco da estrela AU Microscopii não se parecem com nada que tenha sido observado, ou mesmo previsto, até à data. A origem e natureza destas estruturas apresenta aos astrónomos um novo mistério a desvendar. Os resultados deste trabalho serão publicados a 8 de outubro de 2015 na revista Nature.
A estrela próxima AU Microscopii, ou AU Mic, é jovem e encontra-se rodeada por um grande disco de poeira [1]. Estudos de discos de restos como este fornecem pistas valiosas sobre como é que a partir deles se formam os planetas.
Os astrónomos têm estudado o disco da AU Mic no intuito de procurarem sinais de estruturas mais condensadas ou deformadas, já que tais estruturas podem indicar a localização de possíveis planetas. Em 2014 foram utilizadas as capacidades de imagem de alto contraste do instrumento SPHERE do ESO, recém instalado no Very Large Telescope, tendo-se descoberto algo muito invulgar.
“As nossas observações mostraram algo inesperado,” explica Anthony Boccaletti do Observatório de Paris, França, autor principal do artigo científico que descreve estes resultados. “ As imagens do SPHERE mostram um conjunto de estruturas inexplicáveis no disco, em forma de arcos ou ondas, diferentes de tudo o que foi observado até hoje.”
Cinco arcos em forma de onda a diferentes distâncias da estrela aparecem nas novas imagens, fazendo lembrar pequenas ondas propagando-se numa poça de água. Após ter descoberto estas estruturas nos dados do SPHERE, a equipa verificou imagens anteriores do disco obtidas com o Telescópio Espacial Hubble da NASA/ESA em 2010 e 2011 para ver se também aí apareceriam tais estruturas [2]. A equipa não só conseguiu identificar estas estruturas nas imagens mais antigas do Hubble, como também descobriu que estas variam com o tempo. Aparentemente estas ondas estão a deslocar-se — e muito rapidamente!
“Processámos as imagens dos dados Hubble e obtivemos informação suficiente para seguir o movimento destas estranhas estruturas durante um período de 4 anos,” explica o membro da equipa Christian Thalmann (ETH Zürich, Suíça). “Descobrimos assim que os arcos se afastam da estrela a velocidades que vão até aos cerca de 40 000 km/hora!”
As estruturas parecem estar a mover-se mais depressa mais longe da estrela do que mais próximo dela. Pelo menos três delas estão a deslocar-se tão depressa que poderão escapar à atração gravitacional da estrela. Tais velocidades tão elevadas excluem a possibilidade de que estas sejam estruturas convencionais no disco causadas por objetos — tais como planetas — que perturbam o material do disco à medida que orbitam a estrela. Outro fenómeno qualquer deve estar envolvido para que as ondas sejam aceleradas e se desloquem tão depressa, o que significa que estas estruturas são um sinal de algo verdadeiramente invulgar [3].
“Tudo nesta descoberta é bastante surpreendente!” comenta a co-autora Carol Grady da Eureka Scientific, EUA. “E uma vez que nunca foi observado nada do género, e nem sequer previsto pela teoria, podemos apenas tecer conjecturas sobre o que estamos a ver e como é que se poderá ter formado.”
A equipa não pode dizer com toda a certeza o que terá causado estas ondas misteriosas em torno da estrela. No entanto, considerou já uma série de fenómenos que foram rejeitados como explicação possível, incluindo a colisão de dois objetos raros e massivos do tipo de asteróides que libertariam enormes quantidades de poeira, e ondas em espiral com origem em instabilidades na gravidade do sistema.
No entanto, consideraram também outras ideias que parecem mais promissoras.
“Uma explicação possível para estas estranhas estruturas tem a ver com as erupções da estrela. A AU Mic é uma estrela com uma alta atividade de erupções — lançando frequentemente enormes quantidades de energia da sua superfície ou perto dela,” explica o co-autor Glenn Schneider do Steward Observatory, EUA. “Uma destas erupções poderia ter dado origem a algum fenómeno num dos planetas - se houver planetas — como um violento arrancar de matéria que poderia agora estar a propagar-se ao longo do disco, impulsionada pela força da erupção.”
“É muito satisfatório que o SPHERE se tenha revelado extremamente capaz de estudar discos como este no seu primeiro ano de operações,” acrescenta Jean-Luc Beuzit, co-autor do novo estudo e que liderou também o desenvolvimento do SPHERE .
A equipa planeia continuar a observar o sistema AU Mic com o SPHERE e outras infraestruturas, incluindo o ALMA, no intuito de tentar compreender o que se está a passar. Mas por agora, estas curiosas estruturas permanecem um mistério por resolver.
Notas
[1] A AU Microscopii situa-se a apenas 32 anos-luz de distância da Terra. O disco contém essencialmente asteróides que colidiram tão violentamente que acabaram pulverizados.
[2] Os dados foram recolhidos pelo instrumento Space Telescope Imaging Spectrograph (STIS) do Hubble.
[3] O disco é observado de perfil, o que complica a interpretação da sua estrutura tridimensional.
Informações adicionais
Este trabalho foi descrito num artigo científico intitulado “Fast-Moving Structures in the Debris Disk Around AU Microscopii” que será publicado a 8 de outubro de 2015 na revista Nature.
A equipa internacional de astrónomos é composta por: Anthony Boccaletti (Observatoire de Paris, CNRS, França), Christian Thalmann (ETH Zürich, Suíça), Anne-Marie Lagrange (Université Grenoble Alpes, França; CNRS, IPAG, França), Markus Janson (Universidade de Estocolmo, Suécia; Max-Planck-Institut für Astronomie, Alemanha), Jean-Charles Augereau (Université Grenoble Alpes, França; CNRS, IPAG, França), Glenn Schneider (University of Arizona Tucson, EUA), Julien Milli (ESO, Chile; CNRS, IPAG, França), Carol Grady (Eureka Scientific, EUA), John Debes (STScI, EUA), Maud Langlois (CNRS/ENS-L, França), David Mouillet (Université Grenoble Alpes, França; CNRS, IPAG, França), Thomas Henning (Max-Planck-Institut für Astronomie, Alemanha), Carsten Dominik (Universidade de Amesterdão, Holanda), Anne-Lise Maire (INAF–Osservatorio Astronomico di Padova, Itália), Jean-Luc Beuzit (Université Grenoble Alpes, França; CNRS, IPAG, França), Joe Carson (College of Charleston, EUA), Kjetil Dohlen (CNRS, LAM, França), Markus Feldt (Max-Planck-Institut für Astronomie, Alemanha), Thierry Fusco (ONERA, França; CNRS, LAM, França), Christian Ginski (Sterrewacht Leiden, Holanda), Julien H. Girard (ESO, Santiago, Chile; CNRS, IPAG, França), Dean Hines (STScI, EUA), Markus Kasper (ESO, Alemanha; CNRS, IPAG, França), Dimitri Mawet (ESO, Chile), Francois Ménard (Universidad de Chile, Chile), Michael Meyer (ETH Zürich, Suíça), Claire Moutou (CNRS, LAM, França), Johan Olofsson (Max-Planck-Institut für Astronomie, Alemanha), Timothy Rodigas (Carnegie Institution of Washington, EUA), Jean-Francois Sauvage (ONERA, França; CNRS, LAM, França), Joshua Schlieder (NASA Ames Research Center, EUA; Max-Planck-Institut für Astronomie, Alemanha), Hans Martin Schmid (ETH Zürich, Suíça), Massimo Turatto (INAF–Osservatorio Astronomico di Padova, Itália), Stephane Udry (Observatoire de Genève, Suíça), Farrokh Vakili (Université de Nice-Sophia Antipolis, França), Arthur Vigan (CNRS, LAM, França; ESO, Chile), Zahed Wahhaj (ESO, Chile; CNRS, LAM, França) e John Wisniewski (University of Oklahoma, EUA).
O ESO é a mais importante organização europeia intergovernamental para a investigação em astronomia e é de longe o observatório astronómico mais produtivo do mundo. O ESO é financiado por 16 países: Alemanha, Áustria, Bélgica, Brasil, Dinamarca, Espanha, Finlândia, França, Holanda, Itália, Polónia, Portugal, Reino Unido, República Checa, Suécia e Suíça, assim como pelo Chile, o país de acolhimento. O ESO destaca-se por levar a cabo um programa de trabalhos ambicioso, focado na concepção, construção e operação de observatórios astronómicos terrestres de ponta, que possibilitam aos astrónomos importantes descobertas científicas. O ESO também tem um papel importante na promoção e organização de cooperação na investigação astronómica. O ESO mantém em funcionamento três observatórios de ponta no Chile: La Silla, Paranal e Chajnantor. No Paranal, o ESO opera o Very Large Telescope, o observatório astronómico óptico mais avançado do mundo e dois telescópios de rastreio. O VISTA, o maior telescópio de rastreio do mundo que trabalha no infravermelho e o VLT Survey Telescope, o maior telescópio concebido exclusivamente para mapear os céus no visível. O ESO é um parceiro principal no ALMA, o maior projeto astronómico que existe atualmente. E no Cerro Armazones, próximo do Paranal, o ESO está a construir o European Extremely Large Telescope (E-ELT) de 39 metros, que será “o maior olho do mundo virado para o céu”.
Links
- Artigo científico na Nature
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Grenoble, France
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Sobre a Nota de Imprensa
Nº da Notícia: | eso1538pt |
Nome: | Au Mic, Au Microscopii |
Tipo: | Milky Way : Star : Circumstellar Material : Disk : Debris |
Facility: | Hubble Space Telescope, Very Large Telescope |
Instrumentos: | SPHERE |
Science data: | 2015Natur.526..230B |