Nota de Imprensa

As maiores explosões no Universo são despoletadas pelos ímanes mais potentes

Algumas explosões de raios gama de longa duração têm origem em estrelas magnéticas

8 de Julho de 2015

Observações obtidas nos Observatórios de La Silla e Paranal no Chile demonstraram pela primeira vez que existe uma ligação entre uma explosão de raios gama de longa duração e uma explosão de supernova invulgarmente brilhante. Os resultados mostram que a supernova não teve origem em decaimento radioactivo, como se esperava, mas sim em campos magnéticos muito fortes a decair em torno de um objeto exótico conhecido por estrela magnética. Os resultados serão publicados a 9 de julho de 2015 na revista Nature.

As explosões de raios gama constituem um dos eventos associados às maiores explosões que ocorreram desde o Big Bang. São detectadas por telescópios em órbita sensíveis a este tipo de radiação altamente energética, a qual não consegue penetrar a atmosfera terrestre, e são igualmente observadas a maiores comprimentos de onda por outros telescópios, situados tanto no espaço como no solo.

As explosões de raios gama duram tipicamente alguns segundos, mas em casos muito raros podem ocorrer durante horas [1]. Uma destas explosões de longa duração foi captada pelo satélite Swift a 9 de dezembro de 2011 e chamada GRB 111209A. Foi simultaneamente uma das mais longas e mais brilhantes explosões de raios gama alguma vez observada.

À medida que o brilho remanescente da explosão ia desaparecendo, o evento foi estudado pelo instrumento GROND montado no telescópio MPG/ESO de 2,2 metros em La Silla e pelo instrumento X-shooter no Very Large Telescope (VLT) no Paranal. Foi encontrada uma assinatura clara de uma supernova, chamada mais tarde SN 2011kl. Esta é a primeira vez que uma supernova é descoberta associada a uma explosão de raios gama de muito longa duração [2].

O autor principal do novo artigo científico que descreve estes resultados, Jochen Greiner do Max-Planck-Institut für extraterrestrische Physik, Garching, Alemanha, explica: “Uma vez que apenas uma explosão de raios gama de longa duração é produzida para cada 10 000 - 100 000 supernovas, a estrela que explodiu deve ser de algum modo muito especial. Os astrónomos pensavam que estas explosões de raios gama tinham origem em estrelas muito massivas — cerca de 50 vezes a massa do Sol — e que assinalavam a formação de um buraco negro. No entanto, as nossas novas observações da supernova SN 2011kl, descoberta após a GRB 111209A, estão a modificar este paradigma relativamente às explosões de raios gama de muito longa duração.”

Num cenário favorável do colapso de uma estrela massiva, espera-se que a intensa emissão óptica/infravermelha da supernova, com duração de cerca de uma semana, venha do decaimento do níquel-56 radioactivo formado durante a explosão [3]. No entanto, no caso da GRB 111209A as observações combinadas do GROND e do VLT mostraram sem ambiguidades, e pela primeira vez, que isto não era o que se passava [4]. Outras sugestões foram igualmente postas de lado [5].

A única explicação que justifica as observações da supernova que segue a GRB 111209A é que esta terá tido origem numa estrela magnética— uma estrela de neutrões minúscula que roda centenas de vezes por segundo e que possui um campo magnético muito mais potente que as estrelas de neutrões normais, as quais são também conhecidas por pulsares rádio [6]. Pensa-se que as estrelas magnéticas são os objetos mais magnetizados no Universo conhecido. Esta é a primeira vez que uma ligação clara entre uma supernova e uma estrela magnética foi identificada.

Paolo Mazzali, co-autor do estudo, reflete sobre o significado desta nova descoberta: “Estes resultados fornecem evidências de uma relação inesperada entre explosões de raios gama, supernovas muito brilhantes e estrelas magnéticas. Já há alguns anos que suspeitávamos de algumas destas relações do ponto de vista teórico, mas conseguir ligar tudo isto é realmente um desenvolvimento muito interessante.”

“O caso da SN 2011kl/GRB 111209A obriga-nos a considerar alternativas ao cenário de uma estrela em colapso. Estes resultados aproximam-nos de ideias novas e muito mais claras sobre o funcionamento das explosões de raios gama,” conclui Jochen Greiner.

Notas

[1] As explosões de raios gama de longa duração duram entre 2 e 2000 segundos. Existem quatro explosões conhecidas com durações entre 10 000 e 25 000 segundos — as chamadas explosões de raios gama de duração muito longa. Existe também uma classe distinta de explosões de curta duração que se pensa ter origem num mecanismo diferente.

[2] A ligação entre supernovas e explosões de raios gama de longa duração (normal) foi estabelecida inicialmente em 1998, principalmente através de observações da supernova 1998bw obtidas nos observatórios do ESO, e confirmada em 2003 com a GRB 030329.

[3] Pensa-se que a explosão de raios gama propriamente dita tem origem em jactos relativistas produzidos pelo material da estrela a colapsar para um objeto compacto central através de um disco de acreção denso e quente.

[4] A quantidade de níquel-56 medido na supernova com o instrumento GROND é demasiado elevada para poder ser compatível com a emissão ultravioleta forte que se observa com o instrumento X-shooter.

[5] Outras fontes de energia sugeridas para explicar as supernovas superluminosas eram interações por choques com o material circundante — possivelmente ligadas a conchas estelares ejectadas antes da explosão — ou uma estrela progenitora supergigante azul. No caso da SN 2011kl as observações excluem de forma clara ambas estas hipóteses.

[6] As pulsares constituem a classe mais comum de estrelas de neutrões observáveis. Pensa-se que as estrelas magnéticas desenvolvem campos magnéticos 100 a 1000 vezes mais fortes que os observados nas pulsares.

Informações adicionais

Este trabalho foi descrito num artigo científico intitulado “A very luminous magnetar-powered supernova associated with an ultra-long gamma-ray burst”, de J. Greiner et al., que será publicado na revista Nature a 9 de julho de 2015.

A equipa é composta por Jochen Greiner (Max-Planck-Institut für extraterrestrische Physik, Garching, Alemanha [MPE]; Excellence Cluster Universe, Technische Universität München, Garching, Alemanha), Paolo A. Mazzali (Astrophysics Research Institute, Liverpool John Moores University, Liverpool, Inglaterra; Max-Planck-Institut für Astrophysik, Garching, Alemanha [MPA]), D. Alexander Kann (Thüringer Landessternwarte Tautenburg, Tautenburg, Alemanha), Thomas Krühler (ESO, Santiago, Chile) , Elena Pian (INAF, Instituto de Astrofísica Espacial e Física Cósmica, Bolonha, Itália; Scuola Normale Superiore, Pisa, Itália), Simon Prentice (Astrophysics Research Institute, Liverpool John Moores University, Liverpool, Inglaterra), Felipe Olivares E. (Departamento de Ciencias Fisicas, Universidad Andres Bello, Santiago, Chile), Andrea Rossi (Thüringer Landessternwarte Tautenburg, Tautenburg, Alemanha; INAF, Instituto de Astrofísica Espacial e Física Cósmica, Bolonha, Itália), Sylvio Klose (Thüringer Landessternwarte Tautenburg, Tautenburg, Alemanha) , Stefan Taubenberger (MPA; ESO, Garching, Alemanha), Fabian Knust (MPE), Paulo M.J. Afonso (American River College, Sacramento, California, EUA), Chris Ashall (Astrophysics Research Institute, Liverpool John Moores University, Liverpool, Inglaterra), Jan Bolmer (MPE; Technische Universität München, Garching, Alemanha), Corentin Delvaux (MPE), Roland Diehl (MPE), Jonathan Elliott (MPE; Harvard-Smithsonian Center for Astrophysics, Cambridge, Massachusetts, EUA), Robert Filgas (Instituto de Física Experimental e Aplicada, Universidade Técnica de Praga, Praga, República Checa), Johan P.U. Fynbo (DARK Cosmology Center, Niels-Bohr-Institut, Universidade de Copenhaga, Dinamarca), John F. Graham (MPE), Ana Nicuesa Guelbenzu (Thüringer Landessternwarte Tautenburg, Tautenburg, Alemanha), Shiho Kobayashi (Astrophysics Research Institute, Liverpool John Moores University, Liverpool, Inglaterra), Giorgos Leloudas (DARK Cosmology Center, Niels-Bohr-Institut, Universidade de Copenhaga, Dinamarca; Departamento de Física das Partículas & Astrofísica, Instituto Científico Weizmann, Israel), Sandra Savaglio (MPE; Universita della Calabria, Itália), Patricia Schady (MPE), Sebastian Schmidl (Thüringer Landessternwarte Tautenburg, Tautenburg, Alemanha), Tassilo Schweyer (MPE; Technische Universität München, Garching, Alemanha), Vladimir Sudilovsky (MPE; Harvard-Smithonian Center for Astrophysics, Cambridge, Massachusetts, EUA), Mohit Tanga (MPE), Adria C. Updike (Roger Williams University, Bristol, Rhode Island, EUA), Hendrik van Eerten (MPE) e Karla Varela (MPE).

O ESO é a mais importante organização europeia intergovernamental para a investigação em astronomia e é de longe o observatório astronómico mais produtivo do mundo. O ESO é  financiado por 16 países: Alemanha, Áustria, Bélgica, Brasil, Dinamarca, Espanha, Finlândia, França, Holanda, Itália, Polónia, Portugal, Reino Unido, República Checa, Suécia e Suíça, assim como pelo Chile, o país de acolhimento. O ESO destaca-se por levar a cabo um programa de trabalhos ambicioso, focado na concepção, construção e operação de observatórios astronómicos terrestres de ponta, que possibilitam aos astrónomos importantes descobertas científicas. O ESO também tem um papel importante na promoção e organização de cooperação na investigação astronómica. O ESO mantém em funcionamento três observatórios de ponta no Chile: La Silla, Paranal e Chajnantor. No Paranal, o ESO opera  o Very Large Telescope, o observatório astronómico óptico mais avançado do mundo e dois telescópios de rastreio. O VISTA, o maior telescópio de rastreio do mundo que trabalha no infravermelho e o VLT Survey Telescope, o maior telescópio concebido exclusivamente para mapear os céus no visível. O ESO é um parceiro principal no ALMA, o maior projeto astronómico que existe atualmente. E no Cerro Armazones, próximo do Paranal, o ESO está a construir o European Extremely Large Telescope (E-ELT) de 39 metros, que será “o maior olho do mundo virado para o céu”.

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Este texto é a tradução da Nota de Imprensa do ESO eso1527, cortesia do ESON, uma rede de pessoas nos Países Membros do ESO, que servem como pontos de contacto local com os meios de comunicação social, em ligação com os desenvolvimentos do ESO. A representante do nodo português é Margarida Serote.

Sobre a Nota de Imprensa

Nº da Notícia:eso1527pt
Nome:Neutron star
Tipo:Early Universe : Cosmology : Phenomenon : Gamma Ray Burst
Facility:MPG/ESO 2.2-metre telescope, Very Large Telescope
Instrumentos:GROND, X-shooter
Science data:2015Natur.523..189G

Imagens

Impressão artística de uma explosão de raios gama e de uma supernova originadas por uma estrela magnética
Impressão artística de uma explosão de raios gama e de uma supernova originadas por uma estrela magnética