Nota de Imprensa

Descoberta uma “corda de salvamento” para a formação de planetas num sistema binário de estrelas

ALMA examina uma “roda dentro doutra roda” de poeira e gás

29 de Outubro de 2014

Com o auxílio do ALMA os astrónomos detectaram, pela primeira vez, uma corrente de gás que flui desde um disco externo massivo até ao interior de um sistema binário de estrelas. Esta configuração, nunca observada até agora, pode ser responsável por manter um segundo disco de formação planetária, mais pequeno, que, de outro modo, teria desaparecido completamente há muito tempo. Metade das estrelas do tipo solar nascem em sistemas binários e, por isso, esta descoberta tem consequências importantes na procura de exoplanetas. Estes resultados são publicados na revista Nature a 30 de outubro de 2014.

Um grupo de investigação liderado por Anne Dutrey do Laboratório de Astrofísica de Bordeaux, em França, e CNRS, utilizaram o Atacama Large Millimeter/submillimeter Array (ALMA) para observar a distribuição de gás e poeira num sistema estelar múltiplo chamado GG Tau-A [1]. Este objeto tem apenas alguns milhões de anos de idade e situa-se a cerca de 450 anos-luz de distância da Terra na constelação do Touro.

Tal como um roda dentro de uma roda, o GG Tau-A contém um disco exterior maior, que circunda todo o sistema, e um disco interior mais pequeno que se situa em torno da estrela central. Este segundo disco tem uma massa equivalente à de Júpiter e a sua presença tem constituído um mistério para os astrónomos, uma vez que este objeto se encontra a perder matéria para a estrela central a uma taxa tal que deveria já ter-se esgotado completamente há muito tempo atrás.

Ao observar estas estruturas com o auxílio do ALMA, a equipa descobriu nodos de gás na região que se situa entre os dois discos. As novas observações sugerem que existe material que está a ser transferido do disco exterior para o disco interior, criando um tipo de corda de salvamento entre os dois [2].

“Embora em simulações de computador já se tivesse previsto matéria a fluir na região entre os dois discos, é a primeira vez que tal fenómeno é efetivamente observado. O facto de termos detectado estes nodos de matéria, indica-nos que o material se desloca entre os dois discos, permitindo que um se alimente do outro,” explica Dutrey. “Estas observações demonstram que o material do disco exterior consegue sustentar o disco interior durante muito tempo, facto este que tem consequências importantes na potencial formação planetária do sistema.”

Os planetas nascem da matéria que sobra da formação da estrela. Trata-se de um processo lento, o que significa que a presença de um disco que se mantenha durante muito tempo é um pré-requisito para a formação de planetas. Se o processo de “alimentação” do disco interior agora observado pelo ALMA ocorrer noutros sistemas estelares múltiplos, esta descoberta aponta-nos para um vasto número de novas localizações potenciais para encontrar planetas no futuro.

A primeira fase da procura de exoplanetas foi dirigida a estrelas individuais, como o Sol [3]. Mais recentemente mostrou-se que uma grande fração de planetas gigantes orbitam sistemas binários de estrelas. Agora, os investigadores começaram a investigar a possibilidade de planetas orbitarem estrelas individuais inseridas em sistemas estelares múltiplos. Esta nova descoberta apoia a possível existência de tais planetas, fornecendo aos “caçadores” de exoplanetas novos campos por explorar.

Emmanuel Di Folco, co-autor do artigo científico que descreve estes resultados, conclui: “Quase metade das estrelas do tipo solar nasceram em sistemas binários, o que significa que acabámos de descobrir um mecanismo para sustentar a formação planetária que pode ser aplicado a um número significativo de estrelas da Via Láctea. As nossas observações são um enorme passo em frente na verdadeira compreensão da formação planetária.”

Notas

[1] O GG Tau-A faz parte de um sistema estelar múltiplo mais complexo chamado GG Tauri. Observações recentes do GG Tau-A, obtidas com o VLT, revelaram que uma das suas estrelas - GG Tau Ab, a que não se encontra rodeada por um disco - é, ela própria, um sistema binário próximo, constituído pelas estrelas GG Tau-Ab1 e GG Tau-Ab2. Este facto introduz uma quinta componente no sistema GG Tau.

[2] Um resultado anterior do ALMA deu-nos a conhecer uma estrela individual com material que fluí para o seu interior vindo de uma parte exterior do disco que rodeia a estrela.

[3] Uma vez que as órbitas em torno de estrelas binárias são mais complexas e menos estáveis, pensava-se que a formação de planetas nestes sistemas seria mais complicada do que em torno de estrelas individuais.

Informações adicionais

Este trabalho foi descrito num artigo científico intitulado “Planet formation in the young, low-mass multiple stellar system GG Tau-A” de A. Dutrey et al., que será publicado na revista Nature.

A equipa é composta por Anne Dutrey (Universidade de Bordeaux/CNRS, França), Emmanuel Di Folco (Universidade de Bordeaux/CNRS), Stephane Guilloteau (Universidade de Bordeaux/CNRS), Yann Boehler (Universidade do México, Michoacan, México), Jeff Bary (Colgate University, Hamilton, EUA), Tracy Beck (Space Telescope Science Institute, Baltimore, EUA), Hervé Beust (IPAG, Grenoble, França), Edwige Chapillon (Universidade de Bordeaux/IRAM, França), Fredéric Gueth (IRAM, Saint Martin d’Hères, França), Jean-Marc Huré (Universidade de Bordeaux/CNRS), Arnaud Pierens (Universidade de Bordeaux/CNRS), Vincent Piétu (IRAM), Michal Simon (Stony Brook University, EUA) e Ya-Wen Tang (Academia Sinica, Instituto de Astronomia e Astrofísica, Taipei, Ilha Formosa).

O Atacama Large Millimeter/submillimeter Array (ALMA), uma infraestrutura astronómica internacional, é uma parceria entre a Europa, a América do Norte e o Leste Asiático, em cooperação com a República do Chile. O ALMA é financiado na Europa pelo Observatório Europeu do Sul (ESO), na América do Norte pela Fundação Nacional para a Ciência dos Estados Unidos (NSF) em cooperação com o Conselho Nacional de Investigação do Canadá (NRC) e no Leste Asiático pelos Institutos Nacionais de Ciências da Natureza (NINS) do Japão em cooperação com a Academia Sínica (AS) da Ilha Formosa. A construção e operação do ALMA é coordenada pelo ESO, em prol da Europa, pelo Observatório Nacional de Rádio Astronomia (NRAO), que é gerido, pela Associação de Universidades (AUI), em prol da América do Norte e pelo Observatório Astronómico Nacional do Japão (NAOJ), em prol do Leste Asiático. O Observatório ALMA (JAO) fornece uma liderança e direção unificadas na construção, gestão e operação do ALMA.

O ESO é a mais importante organização europeia intergovernamental para a investigação em astronomia e é o observatório astronómico mais produtivo do mundo. O ESO é  financiado por 15 países: Alemanha, Áustria, Bélgica, Brasil, Dinamarca, Espanha, Finlândia, França, Holanda, Itália, Portugal, Reino Unido, República Checa, Suécia e Suíça. O ESO destaca-se por levar a cabo um programa de trabalhos ambicioso, focado na concepção, construção e funcionamento de observatórios astronómicos terrestres de ponta, que possibilitam aos astrónomos importantes descobertas científicas. O ESO também tem um papel importante na promoção e organização de cooperação na investigação astronómica. O ESO mantém em funcionamento três observatórios de ponta, no Chile: La Silla, Paranal e Chajnantor. No Paranal, o ESO opera  o Very Large Telescope, o observatório astronómico óptico mais avançado do mundo e dois telescópios de rastreio. O VISTA, o maior telescópio de rastreio do mundo que trabalha no infravermelho e o VLT Survey Telescope, o maior telescópio concebido exclusivamente para mapear os céus no visível. O ESO é o parceiro europeu do revolucionário telescópio  ALMA, o maior projeto astronómico que existe atualmente. O ESO encontra-se a planear o European Extremely Large Telescope, E-ELT, um telescópio de 39 metros que observará na banda do visível e do infravermelho próximo. O E-ELT será “o maior olho do mundo virado para o céu”.

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Este texto é a tradução da Nota de Imprensa do ESO eso1434, cortesia do ESON, uma rede de pessoas nos Países Membros do ESO, que servem como pontos de contacto local com os meios de comunicação social, em ligação com os desenvolvimentos do ESO. A representante do nodo português é Margarida Serote.

Sobre a Nota de Imprensa

Nº da Notícia:eso1434pt
Nome:GG Tauri
Tipo:Milky Way : Star : Circumstellar Material : Disk
Facility:Atacama Large Millimeter/submillimeter Array
Science data:2014Natur.514..600D

Imagens

Impressão artística do sistema binário de estrelas GG Tauri-A
Impressão artística do sistema binário de estrelas GG Tauri-A
Imagem do céu em torno do sistema estelar múltiplo GG Tauri
Imagem do céu em torno do sistema estelar múltiplo GG Tauri

Vídeos

Impressão artística do sistema binário de estrelas GG Tauri-A
Impressão artística do sistema binário de estrelas GG Tauri-A